“Eu Só Preciso de Motivação” – Disse Alguém Que Nunca Terminou Nada
- N3ssa UN4RTificial
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Atualizado: há 6 dias
Ah, a motivação! Palavra linda, cheia de promessas e que mais parece uma criatura mítica. Ela é o elixir dos coaches, o unicórnio dos preguiçosos e a desculpa perfeita daqueles que vivem no “modo soneca” existencial.
Mas, cá entre nós, quem nunca escutou - ou disse - essa joia da procrastinação disfarçada de autoconhecimento?
Neste artigo, vamos analisar essa declaração universal dos iniciados eternos, dos especialistas em começos e dos mestres da não-ação. Vamos dar uma viajada até o mundo dos que nunca terminam nada, mas acreditam piamente que tudo mudaria se ao menos a motivação aparecesse.
Há algo de podre no Reino da Autoajuda - e é por isso que falaremos deste tema com toda a seriedade de uma comédia.
O que é motivação?
De acordo com os dicionários comportamentais, motivação é o impulso interno que nos faz agir. Blá, blá, blá… Na vida real e na prática, é o fogo no rabo que te faz levantar da cama e escrever aquele ensaio sobre “A Ilusão do Eu” - que já estava mofando há meses. Ou começar aquele programa de alimentação saudável. Ou responder às pessoas que te escreveram há mais de uma semana.
Mas, vamos encarar os fatos: motivação é um amante péssimo - lindo e cheio de promessas no começo, mas que “na hora do vamo vê”, desaparece.
Friedrich Nietzsche, sempre audaz, já dizia que o ser humano cria ilusões para sobreviver ao vazio. E a motivação, com certeza, é uma dessas ilusões.
A Síndrome do Eterno Começo: Uma paixão chamada Ponto de Partida
Falando sério, a maioria pode até discordar, mas não podemos negar que: Começar é fácil. Sim, tudo que é novo tem mais brilho. Os começos embriagam e oferecem a ilusão de infinitas possibilidades. Kierkegaard já dizia: ”… a angústia é a vertigem da liberdade...” e é justamente na liberdade de escolha, no mar de possibilidades, que muitos se afogam.
Mas, por que será que é tão complicado terminar o que começamos? A resposta pode ser simples, a conclusão de algo exige enfrentamento. Finalizar algo significa olhar no espelho e encarar tudo o que fomos, o que deixamos de ser e tudo aquilo que poderíamos ter sido. É ver fracasso e mediocridade onde deveria somente existir responsabilidade. Já o começar, por outro lado, é romantismo puro, tem cheiro de café passado e de caderno caro que não será riscado e usado até o fim.
Motivação não é causa. É consequência.
E a dura verdade que ninguém quer ouvir é: Ninguém age porque está motivado. Mas, todo mundo se motiva porque começou a agir. A ação sempre virá primeiro. A motivação é só o aplauso que ecoa no fim.

Um exemplo disso é começar a fazer caminhada (ou qualquer outro tipo de exercício físico). O primeiro dia é enrolação. No segundo ainda estamos dando desculpas para não ir. No terceiro, talvez, a gente sinta menos dor. Lá no décimo, olhamos no espelho e vemos um mínimo de definição - mesmo ilusória, não importa - mas, algo dentro de nós acende. E eis a motivação ali, como o fogo e não como a faísca.
O Unicórnio Corporativo da Era Moderna e a Geração do Quase
Digamos que, além de vivermos na era do “quase”, a motivação virou fetiche. Ela é vendida e embalada em vídeos de três minutos com trilha sonora épica e frases de impacto fora de contexto. O interessante é que muitos de nós precisam disso para continuar “tocando a vida” - sim, é triste. Tal qual um vício, o mercado da motivação funciona da mesma forma.
O que ninguém diz é que motivação é algo que dá e passa. Ela age da mesma forma que a ressaca moral de domingo à noite, que sempre promete mudanças na segunda-feira - coisa que nunca se cumpre. Mas, a questão aqui não é a ausência de motivação, e sim a falta de disciplina. É muito fácil se sentir motivado com um pôr do sol e prometer-se que amanhã tudo vai mudar. Difícil é acordar cedo na segunda-feira e fazer o que precisa ser feito - mesmo sem vontade.
Nosso querido, azedo e genial Nietzsche disse: “Aquele que tem um porquê enfrenta qualquer como.” Ou seja, se você não sabe o que quer da vida, nenhuma motivação vai ser suficiente para você.
Ninguém ergue estátuas para quem quase fez história. Jean-Paul Sartre dizia que somos condenados a ser livres e nessa liberdade, escolhemos, muitas vezes, a inércia fantasiada de planejamento. E não é que nos falte capacidade, o que nos falta é encarar o fato de que, por trás do discurso da falta de motivação, o que pode existir é medo do fracasso, do julgamento, da mudança e até mesmo de ser bem-sucedido.
Motivação se tornou uma desculpa gourmet para a falta de disciplina e vergonha na cara. Vivemos tempos em que a ideia de ser produtivo requer a compra de cursos, contratação de coaches e ser seguidor de pessoas que nem ao menos sabemos se suas vidas são de fato reais. E, como se não bastasse, onde estão aqueles que compram essas ideias e “técnicas” mas continuam travados e se sentindo ainda mais frustrados? Os “efeitos colaterais” não são mencionados e, quando são, obviamente que em letras ilegíveis.
O que quero dizer é: o problema não são as técnicas, mas a identidade que está por trás da necessidade delas existirem. Enxergar-se como alguém fadado a desistir: “Ah, eu sou assim mesmo.”, “Eu simplesmente não consigo!”... Não, meu caro. Você escolheu ser assim. Assuma! Liberdade implica responsabilidade, inclusive sobre os próprios fracassos.
Práticas brutais e honestas para: se livrar da maldição da não-finalização, parar de depender de motivação e agir com mais consistência
Bom, chega de falácia e vamos ao que interessa. Se você estiver disposto a sair do papel de vítima e assumir a responsabilidade pela sua vida, essas sugestões são para você!
Tenha objetivos claros - não adianta de nada querer “ser melhor”. Melhor para quê? Por quê? Pra quê?
Desligue as notificações quando estiver focado em algo importante - Sério. Todas. Foco não nasce no barulho (a não ser que você treine).
Aprenda a gostar do tédio - a repetição constrói resultados.
Pare de se comparar - Isso não te leva a lugar nenhum, pois a maioria das pessoas usa a comparação como autoflagelação e não como inspiração.
Crie consequências reais - o que vai acontecer se você não fizer o que deve ser feito? Vai continuar da forma que você não quer. Tem castigo maior do que ser medíocre na própria vida? Para mim, não.
Seja seu próprio “chefe” - autoindulgência é o berço do fracasso.
Estabeleça um “prazo da vergonha” - marque datas, compromissos com você mesmo. Risque do seu diálogo (interno e externo) frases como: “quando der eu faço…”, “segunda eu começo…”, “amanhã eu faço…”
Recompense-se pelo esforço e não pelo resultado - torne o processo mais agradável do que o resultado em si.
Aprenda a começar pelo que você odeia - as tarefas menos prazerosas devem sempre ser feitas por primeiro e sem pensar demais. Não lhe dê chances de desistir antes mesmo de começar.
Aceite o fato de que nada vai estar perfeito - faça, pois o que está feito é de longe melhor do que o ideal. O perfeccionismo é só outra forma de medo.
Leia mais biografias e menos frases de autoajuda - as pessoas se acostumaram a desejar as coisas prontas, ignorando o processo por detrás delas. Vai lá ver como a coisa foi construída, quanta disciplina esteve envolvida.
Entenda seus ciclos de energia - pare de se cobrar até a exaustão. Principalmente nós, mulheres, que não possuímos uma linha mensal estável. Respeito é a palavra de ordem aqui!
Mantenha uma lista de coisas finalizadas - assim você vai ver o quanto é capaz.
Crie rituais, não esperança - quem tem esperança está sempre à espera de alguma coisa. Pare de esperar, crie seus próprios rituais, eles dão prazer e o prazer vicia!
Recompense-se, mas com parcimônia - muito mimo cria o quê? Adulto mimado, então pare de proliferar essa “raça”. O mundo já está cheio de gente mimizenta, você não precisa também ser um, para variar.
O Paradoxo da Motivação
Curiosamente, quem precisa de motivação é justamente aquele que mais foge da ação. Sim, é cruel, mas é real. Quem vive buscando se motivar é - muitas vezes - quem já decidiu, mesmo que inconscientemente - que não irá finalizar a coisa em si. Esses são aqueles que buscam no externo o que na verdade deveria ser um compromisso interno.

A disciplina é chata, mas é fiel. A motivação pode até ser sexy, mas é uma traíra.
Simone de Beauvoir diria: “É pelo trabalho que a mulher se liberta do homem, e o homem do tédio.” Substitua a palavra “trabalho” por “ação” e você virará uma chave.
Resumo para os motivados
Se você chegou até aqui esperando uma fórmula mágica de motivação, sinto muito. O que você precisa não é de motivação, talvez só um pouco de vergonha na cara e uma dose de autoironia. Motivação não dá em árvore. Mas talvez você compreenda que ela não salva ninguém de nada.
Ela pode inspirar, mas quem irá construir será a disciplina. O hábito molda, mas é a persistência, aquela chata insistente, que irá transformar qualquer projeto em realização.
O que precisamos é de mais atitude, mais ação e não mais motivação. É necessário criar coragem para continuar, mesmo sem o aplauso interno. Pois, a motivação irá embora, mas o hábito ficará.
Portanto, não nos enganemos mais. Comecemos agora. Mesmo que sem vontade, mesmo sem ânimo. Ninguém irá nos salvar da prisão confortável que nós mesmos construímos.
E se você é do tipo que curte um soco filosófico e um chute de ironia, continue lendo os outros artigos do blog. Aqui o papo é reto e sem maquiagem, onde cada texto possui sua versão em áudio - sem cortes e sem edição - para você ouvir enquanto vive.
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E lembre-se: A dor do arrependimento é silenciosa, mas insuportável. A dor da ação é ruidosa, mas libertadora. Na hora da morte, é preferível morrer com memórias do que com sonhos.
“A ilusão se desfaz quando questionamos a realidade.” - UN4RT
Aqui estão as fontes, referências e inspirações. Vai lá ler vai.
Friedrich Nietzsche, Assim Falou Zaratustra.
Søren Kierkegaard, O Conceito de Angústia.
Jean-Paul Sartre, O Ser e o Nada.
Simone de Beauvoir, O Segundo Sexo.
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